Último dia


Delhi, 08 de maio de 2011.

Me perguntaram outro dia se quando eu fiquei de frente para o Taj Mahal, se tive a sensação de que aquela situação não era real, de que era um sonho.
No começo da viagem, enquanto estava no primeiro mês, realmente tive essa sensação, de não acreditar direito que eu estava vendo aquilo na minha frente, tudo aquilo que tinha visto em fotos: os Moais na Ilha de Páscoa, a cor da água das praias de Bora Bora, as montanhas da Nova Zelândia, a cultura chinesa em Hong Kong, tive momentos que realmente mexeram muito com minhas emoções, como na lojinha de antiguidades em Macau que até lagrimei ao me dar conta que estava de verdade na China. Quando cheguei na Indonésia, durante o segundo mês de viagem, já era o meu sexto país, aquela ideia do irreal foi se desfazendo e fui sentindo mais firmeza no chão onde pisava. Enquanto cruzei o sudeste asiático, onde  choque cultural foi bem pequeno, ratifiquei no meu subconsciente que o mundo era realmente palpável e real, os templos de Bangkok realmente existiam.
Agora depois de um tempo tendo a mudança de cidades e países como rotina,  vejo as coisas de forma mais realista,  me dei conta que o mundo é de verdade mesmo, e que se alguém escreveu em algum lugar, um guia ou um livro que certo lugar é mágico e sentimos isso ou aquilo, é a opnião dele. Não acredito em lugares que possuem energia. Cada pessoa sente de forma diferente, o remédio que serve para mim, pode não servir para você. Podemos sentir uma energia boa numa pequena e simples cidade, e não sentir nada num local super sagrado.  
 E qualquer lugar está ao meu alcance, o mundo ficou menor, basta pegar um ônibus, avião, riquixá, sei lá, tuk tuk, trem, ...e pronto. Não tem tanta magia, é só ir e ver. Daqui a alguns dias estarei indo para o Oriente Médio. Sim , claro que estou ansioso para  chegar no mundo árabe, mas é uma ansiedade que não tem nada de conto de fadas e mistério. As cidades estão lá, elas são de verdade, são concretas. Tenho pela frente mais duas maravilhas do mundo, Petra na Jordânia e o Coliseu de Roma, fora outros lugares mundialmente conhecidos como o Mar Morto, as pirâmides do Egito, os locais sagrados do cristianismo em Israel, a Torre Eiffel, e mais um monte de lugares fantásticos. Sei que vou chegar lá, deixar minha mochila no albergue, andar pelas ruas que são de verdade e ver todos esses lugares que também são de verdade, com gente normal passando por perto, indo pro trabalho, camelôs vendendo bagulho, turista batendo foto... . Mas claro, sentindo sempre a sensação de realização do meu sonho de conhecer o mundo.
Viajar para outros os países que tenho pela frente, considero como uma consequência de um planejamento. Não confundam isso que estou dizendo, como se tivesse perdido a graça. Deixa eu tentar dar um exemplo tosco, imaginem um jovem empreendedor que abre um negócio, ele fica super empolgado, se dedica ao máximo, tenta aprender tudo que for possível para melhorar  e alavancar seu empreendimento, mas está cheio de dúvidas, ingenuidades, dando passos curtos com medo de falir. Depois de um tempo a sua loja cresce e ele abre uma filial em outro bairro, tudo aquilo ainda é novo administrar duas empresas, ele ainda se atrapalha e se preocupa com vários problemas. Até que abre mais três outras filiais, nesse ponto ele já está bem mais seguro da situação, e ainda lembra quando ele tinha apenas uma lojinha. Com o tempo monta mais dez filiais em outros estados, ele já tem o controle da situação, já sabe tudo como funciona , conhece muito bem  as regras de mercado, e administra muito bem todas as suas empresas. Nesse momento a cada filial que pensa em abrir numa cidade desconhecida, será uma consequência do seu trabalho, e ele não vai sentir aquela insegurança ou medo de enfrentar um novo mercado. Não que tenha perdido a graça, ele vai continuar se esforçando e sentindo satisfação em cada passo dado. Mas nessa altura do campeonato, ele sabe que as cidades estão lá, basta fazer uma análise de mercado e com sua experiência montar sua filial sabendo bem o que fazer e como tirar melhor proveito.
Voltando ao assunto..., o que corrobora para que se crie toda uma magia em torno de um lugar no mundo que queremos conhecer, é pensarmos que é impossível de chegarmos lá, pensarmos que é difícil ou que precisa de muito dinheiro. Eu tenho colocado alguns valores aqui no blog  justamente para quebrar essa ideia de que viajar é caro. Não gosto de colocar muitos números, eles tornam o texto cansativo, mas sempre que coloco  alguns preços é com esse objetivo, mostrar que o mais importante é a pessoa gostar realmente de viajar, ter curiosidade em conhecer o mundo.  
 O caso é o simples, é preciso sonhar e agir ao mesmo tempo. Só sonhar e não fazer nada em prol do sonho, não adianta nada e pode virar uma frustração no futuro. Não adianta ter pensamento positivo, fé, rezar todo dia, acender vela e esperar cair do céu uma passagem de avião na sua mão. Tem que agir, de forma objetiva e com determinação. Um bom passo inicial é buscar informação, para apagar a ideia de que viajar é difícil ou perigoso. Ler bastante sobre o assunto, relatos de viajantes, livros, blogs, fóruns, na internet tem muita informação. Isso é para quem quer mochilar, que é um tipo de viagem completamente diferente de pacotes turísticos, onde a agência toma conta de tudo, e você não precisa saber de nada, nem onde o Nepal ou o Laos ficam no mapa, basta obedecer o que o seu guia lhe manda fazer e bater suas fotos dizendo que “conheceu” o lugar. Viajar com pacotes turísticos é uma viagem com praticamente nenhum risco mas pode ser uma boa forma para se perder o medo, principalmente em destinos como a Ásia. O problema é que não existe a descoberta, a busca, o contato mais próximo com o povo local.
Exemplo de uma situação - eu saí do hotel que pago 4 reais a diária, chegando em Agra, paguei 1 real de riquixá, comi numa banquinha de rua por 1,50 reais e mais 4 reais para um guia(o que fiz pouquíssimas vezes, prefiro ler as informações das placas no local, o Lonely Planet e morcegar algum guia de outros grupos).  Entrei no Taj Mahal com o meu chinelinho empoeirado do mesmo jeito ou até melhor por ter sentido todo o percurso,  que os caras chegando de ônibus de excursão que devem ter pago algumas centenas de dólares para ter “tudo incluso”. Na cabeça de quem está aí no Brasil por exemplo, ou em qualquer outro país do ocidente, sentado na sua sala confortável assistindo televisão, é apavorante a ideia de  ir sozinho para um país super exótico como a Índia, e ter que fazer tudo por conta própria. Como ele não sabe de nada, talvez nem onde fica direito a Índia, ele paga uns 1000 dólares além do valor da passagem num pacote de 1-2 semanas para ter todos esses serviços, que por conta própria gastaria 150.    Para o mochileiro que tem informação e não tem esse medo, tudo é fácil. Ando aqui na Índia como se estivesse no interior do Pará, pegando ônibus locais e nas cidades maiores ônibus urbanos.     
  Hoje é meu último dia na Índia, e toda vez, no último dia de um país, dá uma ponta de conquista misturado com saudade. E a dúvida... será que volto aqui um dia? Como será quando eu voltar, o que vou sentir? Esse último dia, fico o tempo todo pensando...será que esse é meu último Thali que vou comer, ou será que é a última bia hoi que vou beber? Olho já com olhar saudoso tudo aquilo, parece que as expressões das pessoas se tornam mais fortes, pois imagino que vou perder pra sempre aquela visão, e olho com atenção redobrada. Dia de se dar conta que o índice de estranheza do ambiente se ajustou com a minha percepção e passo a me sentir integrado naquele meio. É dia de olhar as coisas típicas nas ruas e ter a sensação que não se comprou o bastante, ou que deveria ter comprado mais presentes. Ao mesmo tempo imagino que souvenirs que eu comprar de presente, não sei se vou agradar. Eu gosto dessas cores, dessas formas e desses símbolos, porque estou aqui, e não vai ser a mesma coisa para quem não veio. A sensação de saudade sentida nos últimos momentos em um país é por vezes substituída por uma ansiedade e curiosidade enorme que tenho para chegar no país seguinte. Tento então ver essa despedida como uma página virada, e esperar ansioso o que vem pela frente.
Ainda com cara de sono, chegando na estação de trem em Delhi

Cuidando do visual

Em algum mercado de Delhi

Os barbeiros de rua são bem tradicionais, fiz a barba (40 centavos de real!)com
direito a massagem facial, loção pós-barba, e creme hidratante

 A Índia tem uma alma muito forte, um comportamento muito peculiar. Nesses dois meses entre Nepal e Índia tive tempo de me acostumar com algumas coisas: os adereços usados pelas mulheres : piercings(que deve ter outro nome) no nariz usado inclusive por crianças e senhoras idosas, os brincos com uma correntinha que passa por cima da orelha, as pintas na testa e na cabeça, os sáris, as pulseiras, tornozeleiras e anéis nos dedos dos pés. Todas elas usam muitos adornos. Crianças com os olhos pintados de lápis. As tatuagens de henna também são muito comuns nas mãos, braços e pés das mulheres, independente da idade. Não vemos demonstrações de afeto em público, da mesma forma em quase toda a Ásia, como casais de mãos dadas. Dificilmente vemos casais conversando nas ruas. Paradoxalmente, os homens mostram afeto entre si, andam de mãos dadas ou abraçados normalmente.
Em Delhi, a capital do país, vemos algumas coisas mais ocidentalizadas, como mulheres com roupas “normais”, casais conversando mais próximos, mulheres trabalhando(o que não se vê em cidades menores). Nos shopping centers vemos no cardápio do Mc Donalds um hambúrguer vegetariano e um ‘Mc Chicken Marajá’.
Protético nas ruas de Delhi, deve ser o mesmo cara que faz extrações
 dentárias, mas não esperei pra ver chegava algum cliente.
Na foto ele está fazendo uma prótese.

Entrada do Red Fort em Delhi

Jardim do Red Fort

Red Fort

Passei 3 dias em Delhi, em uma manhã visitei pontos turísticos
e o resto só andei para curtir a cidade

Banheiro público

 Nesse tempo por aqui, tive uma alimentação basicamente vegetariana, eles preparam uns pratos com sabor bem apurado, não senti nem um pouco falta de carne, dá pra viver bem sem carne sim. Gostei da comida na Índia, os curries(pratos temperados com curry, um tempero indiano amarelo de sabor bem forte), masalas, o Dal e o Thali (espécie de lentilhas) a samussa (tipo de pastel recheado de batata) e mais um monte de prato que não lembro o nome. Gosto de pedir no restaurante um set com uma pequena porção de vários pratos. Os doces, quase todos à base de leite, e outras iguarias lácteas: coalhada, lassi, iogurte e um outro muito bom, que era um leite bem fervido, antes de virar doce de leite (com um sabor tipo de leite feito com leite moça). Como não se mata vaca por aqui, elas são numerosas e fornecem muito leite para a alimentaçao dos indianos.
Set com vários pratos vegetarianos e o Chapati (pão)

Não vi telefone público nas ruas, só esses carrinhos aí

Templo de Lótus em Delhi

Mulher com tatuagem de henna nos braços e  pés

Banca de especiarias

 A loucura, o barulho, a sujeira e o caos foram com o tempo passando mais despercebidos. No trânsito, motoristas e pedestres, todos, não demonstram impaciência ou estresse, todo essa loucura de buzinas parece ser normal, parece estar incorporado no comportamento...diferente de nós, que quando usamos a buzina  normalmente ela vem acompanhada de um xingamento, um grito ou pelo menos uma expressão de descontentamento. Eles o fazem normalmente, como se estivessem pedindo licença.
Rua no centro de Delhi...barulho, muita gente, vacas, vendedores insistentes,
lixo, pedintes... uma cagada!

 Estou no aeroporto, vou dormir por aqui hoje. É um aeroporto enorme e moderno, um dos melhores do mundo. O metrô trem uma linha especial para cá, moderníssima de primeira qualidade.

Namastê.


2 comentários:

Anônimo disse...

Ei Leio, é claaaro que ainda vais voltar por estes países...ainda vais me mostrar todos eles...
Bjs
Lhanne

Andando por aí.... disse...

Se vc não publicar um livro com seus textos qdo voltar eu te encho de porrada e te quebro a cara. Vou te ajudar a publicar pelo "meu selo"