Solidão feliz

Ban Lung – Camboja, 08 de dezembro de 2010.

Solidão.Quero falar um pouco sobre esse sentimento que na maioria das vezes é tido como negativo, e tentar - mesmo sabendo que não vou conseguir - fazer com que vocês vejam de outra forma a questão do estar só . Já falei um pouco sobre viajar só em outro post, nesse vou ser mais específico na relação do ‘eu comigo mesmo’. Eu digo isso porque quando falo com amigos do Brasil, muitos me perguntam sobre esse assunto, como eu estou lidando com a solidão e como está sendo “enfrentar essa fase”. Gente, estar só para mim muitas vezes é um prazer, uma opção, muitas vezes faço questão, acreditem! Aqui no sudeste asiático principalmente, onde é muito fácil fazer amizades, claro que depende do seu approach, para os tímidos se torna mais difícil, mas aqui funciona mais ou menos assim, ficamos sozinhos quando queremos. Estamos sempre frente à uma oportunidade de conhecer gente, no albergue, no restaurante, no ônibus... estamos sempre abertos. Basta puxar papo com alguém, e depois de algum tempo você já está passeando junto, dividindo quarto ou tomando uma cerveja...

Me sinto muito bem comigo mesmo, tem momentos que me isolo de propósito pra ficar feliz. É na solidão que paradoxalmente eu tenho um encontro. Por exemplo, pra ler alguma coisa, escrever aqui pro blog, passear num mercado ou andar na rua. Coisas que são bem melhores fazer sozinho, sem falatórios ou risos...consigo me concentrar melhor ao ler ou escrever, as ideias surgem sem interferência externa.E passear na rua, num mercado por exemplo? Com um grupo é horrível, se você vê alguma coisa interessante não quer parar muito tempo pra não atrapalhar ‘o andamento do grupo’, se alguém para numa barraca, você tem que parar pra esperar, tirando o sossego do outro... aí fica o tempo todo preguntando : cadê fulano? aí para e espera. Ou seja, não curte direito o passeio, fica mais preocupado no grupo. Gosto de saborear alguns lugares sem pressa e sem outras preocupações: paro, cheiro, provo, pergunto, observo detalhes. Nesse caso eu tô falando  de viagens, em outras situações é claro que quanto mais gente melhor, numa praia, numa festa, num bar...

As pessoas têm dificuldade de dissociar a palavra solidão do significado de tristeza, de vazio. Isso depende de como você se comporta na sua solidão. De como você a vê. Se chamo minha solidão de feliz, ela será feliz. As coisas são aquilo que colocamos nomes. Outra coisa que adoro fazer só também: correr ou andar de bicicleta, principalmente num final de tarde, no pôr-do-sol. Se vocês nunca fizeram, experimentem. O turbilhão de pensamentos e ideias que surgem enquanto estamos pedalando sozinhos...a cabeça não para um instante, eu falo sozinho, canto, acho graça de mim mesmo. Isso ajuda a decidir um monte de coisa, renova os pensamentos e relembra outros. Uma espécie de ruminação de ideias. Ás vezes saio pra correr ou pedalar só pra pensar e decidir sobre alguma coisa...

Vários escritores memoráveis apreciam e descrevem os momentos maravilhosos que a solidão traz. Teve um filósofo que li uma vez, esqueci  seu nome, aliás os filósofos têm uma capacidade absurda de descrever os sentimentos humanos, ele disse que o início da infelicidade humana se origina na comparação. Se observamos a solidão como uma forma de infelicidade e analisarmos de onde ela surge, provavelmente vamos fazer alguma comparação, vamos imaginar um grupo de amigos rindo à toa, um casal de namorados compartilhando momentos...nada disso é real, é uma comparação negativa, destrutiva, com uma pitada de inveja. Se for pra sentir tristeza puramente por causa da solidão tudo bem, que seja, mas sem comparações. E provavelmente dessa solidão pode surgir a felicidade.

Sentir-se bem quando estamos sós é um dom mas acho que também é algo que pode ser trabalhado. A maior liberdade que podemos ter é  a possibilidade de ficar sós.
A propósito, estou passando pelos melhores dias da minha vida!

4 comentários:

Marcelo disse...

Ei Rogerio, viajar é a melhor coisa que alguém pode fazer na vida, né? Legal, aproveite!

Cara, isso foi difícil eu explicar também pra uma galera: o quanto eu gostei de fazer as coisas sozinho.. estar no silêncio, fazer as coisas no meu tempo.. e quando eu queria amigos, pronto!

É, a capacidade de estar sozinho é uma coisa elevada!

Olhos Espertos disse...

Minha primeira visita ao seu blog.
Gostei muito dessa postagem. A capacidade de estar só é algo que adquirimos, ou não, ainda crianças e quando isso não acontece tendemos a sofrer com coisas que deveriam nos trazer outros sentimentos.

Belo texto, bela experiência a sua...

Rogério Oliveira disse...

Obrigado Olhos Espertos...fico lisonjeado em receber um comentário positivo de uma psicóloga, principalmente de um texto sobre sentimentos...

Luiz Flávio Pamplona disse...

A liberdade vivenciada quando estamos sozinhos é uma liberdade que pouco constrói em termos de civilização, mas que pode ser rica em muitos outros sentidos para a vida das pessoas, quando bem trabalhada. É salutar termos a percepção de que não somos tão dependentes uns dos outros, sem perder de vista que a independencia absoluta é uma ilusão egoísta e impossível.
Na minha modesta opnião a maior liberdade que temos está na possibilidade de pensar e manifestar nossos pensamentos livremente, do direito de ir e vir, de decidir os rumos da nossa vida... a liberdade ganha uma amplitude muito maior quando estamos em sociedade...
Quero deixar claro que entendo a essência do seu texto... minhas ponderações servem apenas para ilustrar um visão macro do que pode vir a ser a liberdade...